sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Quiz Show - A verdade dos bastidores



Quiz Show – A verdade dos bastidores (Quiz Show)

Direção: Robert Redford

Ano de produção: 1994

Com: Rob Morrow, Ralph Fiennes, John Turturro, David Paymer, Martin Scorsese, Paul Scofield, Mira Sorvino, Barry Levinson, Ethan Hawke.

Gênero: Drama

Classificação Etária: LIVRE


‘Quiz Show’ é hollywoodiano, mas poderia ser muito bem brasileiro

            Não é de hoje que a opinião pública questiona a veracidade do conteúdo da TV, em especial dos canais abertos. Mas, estamos em 2014, bombardeados de informações para todos os lados e questionar de forma mais aberta e íntegra se torna mais viável. Mas, no final dos anos 1950, isso era impensável. Enquanto aqui no Brasil a TV ainda engatinhava (ela chegara no ano de 1950), nos EUA já estava consolidada como o principal meio de comunicação daquele país. Era comum a família americana reunida em volta da TV todas as noites e saboreando a programação. Era o símbolo do chamado “American Way of Life”. O modo de vida americano é o novo sonho para as famílias desde o final da 2ª Guerra Mundial, quando o país se saiu vitorioso.

            Neste cenário, a TV tinha a obrigação de entreter seu povo. Havia notícias, filmes e séries, mas existia um estilo de programa que logo se tornou febre e as famílias salivavam quando anunciava que a atração iria começar, que eram os programas de perguntas e respostas.

            Nos canais mais alternativos existia sim, esse tipo de programa, mas ele se tornou popular com o grande sucesso “21”, na rede NBC.

            O programa era visto por 50 milhões de lares e consistia em um confronto entre dois participantes em que as perguntas eram diversas e difíceis. Quem ganha, continua para a semana seguinte. Quem perdesse, estava fora e no filme somos apresentados a Herbie Stempel (papel de John Turturro), que está invicto há 11 semanas. Mas, Herbie começa a incomodar os produtores do programa devido ao seu temperamento e logo a produção começa a procurar um substituto para “vencedor” do programa. E a pessoa ideal encontrada é a professor universitário Charles Van Doren (vivido por um inspirado Ralph Fiennes). Ele é charmoso, carismático, inteligente e logo se torna uma celebridade da noite para o dia.

            Charles ficou invicto no programa por 14 semanas e ganhou muito mais do que ganharia dando aula. Todo esse glamour do programa chama a atenção do investigador Dick Goodwin (Rob Morrow, ótimo no papel!), que logo descobre que o programa é manipulado e as perguntas são combinadas entre a produção do programa e o participante e começa a investigar e descobrir as sujeiras por debaixo dos panos.

            O filme de Robert Redford possui diálogos poderosos e conta uma história que precisava ser colocada em tela. Mais do que isso, é um retrato muito sério e correto sobre um episódio que marcou uma época, além da brilhante reconstrução, fruto de uma Direção de Arte e Figurinos muito bem cuidados.

            Ao contrário de outro filme ácido sobre a sujeira da TV, ‘Rede de Intrigas’, de 1976, que é mais uma paródia levada a sério, aqui a coisa é tratada com a seriedade que foi o tamanho de seu escândalo em atuações poderosas. O quarteto de protagonistas é sensacional. Rob Morrow que é quase o mocinho da trama. Ele investiga até as últimas conseqüências o que se passa por dentro da emissora de televisão. Ralph Fiennes traz a imagem de homem poderoso e seguro de si, mas, na verdade, é um peão nesse jogo de xadrez e jogo de interesses. John Turturro é um sujeito que tenta bater de frente com o sistema, mas, se sente impotente perante os poderosos. E já David Paymer, como o cínico e arrogante produtor do programa, é concordante com a sujeira toda e é tão corrupto quanto seu chefe, dono da emissora.

            Até mesmo a pergunta que Herbie é obrigado a errar é uma referência cinematográfica, quando cita dois vencedores de Oscar, do ano de 1955 e 1956, respectivamente, ‘Sindicato de Ladrões’ e ‘Marty’.

            É interessante se analisarmos que esse caso é real e a emissora em questão, a NBC, não foi responsabilizada por seus atos. Acontece muito como no Brasil, há corrupção política e policial sim, mas, os meios de comunicação, em especial, as emissoras, se denominam as intocáveis e perfeitas perante o público. Mais do que isso, trazem uma pseudo-imagem de imparcialidade, quando há muito interesse em jogo.

            Questionar as informações que nos chegam é de fundamental importância para a formação do senso crítico. No filme aqui, o dono da emissora se protege quando confrontado sobre a idoneidade do programa, pois diz que sua função é só entretenimento. Na verdade, mesmo programas com o intuito do show bizz devem sim, fornecer o melhor para o povo, afinal, se a emissora é aberta e, portanto, de domínio público, é de total obrigação fornecer algo idôneo e de qualidade.

            A frase que fecha o filme é arrepiante, cínica e reflete todo o espírito de como funciona a lógica do pão e circo: “Não somos criminosos, somos uma empresa. Ao fazer o que fizemos, foi feito pelo bem do povo. Nós faturamos, os patrocinadores faturam, transmitimos conhecimento, e o público se diverte. Todo mundo sai ganhando”.

            E mesmo escolher uma pessoa charmosa como Charles Van Doren para ser “herói nacional” é uma forma de cultivar o pão e circo, afinal, o povo precisa de heróis e de pessoas para torcer e se identificar. Aqui no Brasil, heróis do esporte aparecem de vez em quando, na maioria das vezes, propagados pela mídia e tratados como deuses e intocáveis.

            ‘Quiz Show – A verdade dos bastidores’ merece ser visto como objeto de estudo por pessoas comuns, jornalistas e estudantes de direito, jornalismo e ciências políticas e sociais. E merece ser discutido depois em uma mesa redonda por especialistas e leigos.

            ‘Quiz Show – A verdade dos bastidores’ foi indicado a 7 Oscars mas saiu de mãos vazias em 1995. Melhor Filme, Direção, Roteiro Adaptado, Ator Coadjuvante foram algumas delas. Foi ovacionado pela crítica, mas não deu público.

            E eu não poderia terminar esse comentário sem falar de duas atuações especiais neste filme: o diretor Martin Scorsese faz muito bem o papel de um sujeito cínico e temos também uma quase ponta de Mira Sorvino como esposa de Dick. Mira ganharia seu Oscar no ano seguinte por ‘Poderosa Afrodite’. Era uma atriz que prometia muito e a Indústria tratou de estragá-la em papéis sem destaque nunca mais fazendo um filme digno de nota. Coisas da vida.


Nota: 10,0

Imagens:







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