segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Ponte de Espiões


Ponte de Espiões (Bridge of Spies)

Direção: Steven Spielberg

2015

Com: Tom Hanks, Mark Rylance, Scott Shepherd, Amy Ryan, Alan Alda.

Drama

14 Anos

Spielberg sendo Spielberg

            Steven Spielberg na direção. Tom Hanks no papel principal. E os irmãos Coen na revisão do roteiro. Com um “currículo” desses, não tinha como ‘Ponte de Espiões’ dar errado.

            ‘Ponte de Espiões’ é baseado em uma incrível história real que se passa em 1957, que era o auge da Guerra Fria, na qual temos um advogado especializado em seguros, James Donovan (papel de Tom Hanks) que é designado a defender um sujeito chamado Rudolf Abel (Mark Rylance, ótimo no papel!), que é um espião soviético capturado em solo americano.

            Para provar que é um país justo, Abel tem um julgamento comum, mas acaba sendo condenado por um júri tendencioso. Mas Donovan consegue que ele não morra e a CIA negocia com o advogado para devolver Abel para a URSS em troca de um cidadão americano capturado pelos soviéticos.

            Neste cenário, ‘Ponte de Espiões’ se torna dois filmes em um: são duas horas de filme e na primeira hora temos um drama de tribunal, na qual vemos Donovan defendendo Abel e o filme mostra a paranóia americana com o medo do inimigo e a caça ao comunismo. Durante o processo, Donovan se torna o homem mais odiado de seu país e tem até a sua casa atacada.

            Na segunda hora (e muito menos interessante) a história se passa quase toda em Berlim, onde ocorrem as negociações entre os dois países, EUA e URSS.

            ‘Ponte de Espiões’ é composto, basicamente, por diálogos e o público médio pode se entediar, portanto, se a intenção é ir ao cinema se divertir, este é o filme errado. Nada do que Spielberg não esteja acostumado, seu último filme, Lincoln, por exemplo, foi assim
            Tecnicamente, ‘Ponte de Espiões’ é perfeito: tem uma fotografia arrebatadora, uma direção de arte poderosa (e podem ir ao Oscar) e por se passar em 1957, dá para notar o Muro de Berlim sendo construído (que viria a ficar em pé em 1961).

            Tom Hanks tem uma atuação mais contida, mas sua frieza foi importante para mostrar um personagem que tem uma nação inteira contra ele, tendo que negociar com os poderosos e ainda convencer o território inimigo de um acordo – em pleno auge da Guerra Fria e do mundo polarizado.

            Quem dá o show, porém, é Mark Rylance, que interpreta Rudolf Abel. Ele rouba todas as cenas de Tom Hanks (e isso não é uma missão fácil), é onipresente na primeira hora, mas aparece pouco na segunda. E se vier alguma indicação para Ator Coadjuvante, será justa. Desde a primeira cena, quando ele está pintando um quadro, até aos ótimos diálogos com Tom Hanks, Abel é um grande personagem e, para o futuro, vai entrar nas listas de “coadjuvantes melhores do que os protagonistas”.

            O roteiro dos irmãos Coen foi muito cuidadoso ao tratar a Guerra Fria de forma imparcial (que também não foi uma tarefa fácil) ao mostrar a paranóia dos dois lados e mostrando os dois países com discurso de ódio.

            A direção de Spielberg, porém, exalta o “american way of life” e com uma trilha sonora claramente patriótica, que sobe a cada ação de Tom Hanks – ou mostrando-o como um bom homem de família, atrás do chamado “sonho americano”.

            ‘Ponte de Espiões’ tem uma história poderosa e mesmo passados quase 60 anos, merece ser contada, mas foi uma grande pena que algumas decisões tomadas por um sujeito que sabe fazer cinema – e foi o responsável por muita gente se interessar por cinema – deixaram o filme aquém do esperado, mas ainda assim, fica acima da média de 3 deslizes recentes do diretor: ‘Lincoln’, ‘Cavalo de Guerra’ e ‘Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal’.

Nota: 8,0

Imagens:









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segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Beasts of no Nation


Beasts of no Nation

Direção: Cary Fukunaga

2015

Com: Idris Elba, Abraham Attah, Jude Akuwudike.

Drama

18 Anos

Netflix começa nos longa-metragens com o pé direito

            Em 2013 quando a Netflix começou com suas produções próprias, muitos desconfiaram se o serviço se sustentaria. Mas eis que naquele mesmo ano ela lança duas séries excelentes, aclamadas por público, crítica e premiações: House of Cards e Orange is the New Black, que abriu passagem para outras grandes produções como Sense8 e Demolidor.

            Mas a Netflix não se contentou em ficar “apenas” nas séries de TV e agora começa a investir nos longas metragens: Beasts of no Nation é seu primeiro filme original e assim como as séries de TV, está arrancando elogios do público, crítica e também está cotado para as premiações.

            E tem mais: assim como na estréia de House of Cards, sua primeira série original, na qual o serviço precisava se provar, ela chamou nomes de peso: o diretor David Fincher na produção e direção de alguns episódios e o oscarizado Kevin Spacey no papel principal.
            Aqui não é diferente: também foram chamados nomes de peso: o diretor, roteirista, produtor e diretor de fotografia é Cary Fukunaga, que dirigiu os episódios da 1ª temporada de True Detective, série da HBO (que curiosamente é hoje a maior rival da Netflix) e o protagonista é o ótimo Idris Elba, que também é produtor.

            E o resultado é um filme extremamente poderoso, muito bem realizado, perturbador e sem sutilezas. Quem está à procura de algo para se divertir, é melhor procurar outra coisa, pois estamos diante de um dos filmes mais densos do ano (se não, o mais), praticamente não há respiro e não há alívio cômico e lembra muito um outro grande filme: Cidade de Deus.

            As semelhanças com o filme de Fernando Meirelles estão na fotografia, na narrativa em primeira pessoa, sob o ponto de vista de uma criança no meio do fogo cruzado e há dois momentos na qual a referência está clara: quando o personagem de Idris Elba obriga o garoto Agu a assassinar a sangue frio um suspeito de ser o inimigo. E assim como foi em ‘Quem Quer Ser um Milionário?’, existe a famosa perseguição à galinha.

            Na história, um garoto pobre de um país africano chamado Agu (uma revelação em pessoa) vê sua família ser assassinada por um grupo terrorista, mas consegue fugir e é “acolhido” por um grupo de rebeldes liderado pelo Comandante (Idris Elba, ótimo no papel), onde é treinado para ser um soldado.

            Tanto o país onde ocorre o conflito quanto o nome do comandante jamais são revelados, e nem foi essa a intenção de Cary: o objetivo era mostrar que uma guerra é ruim para ambos os lados, inclusive do vencedor e, sobretudo, a perda da inocência.

            Mostrar uma guerra sob o ponto de vista de uma criança não é nenhuma novidade: ‘O Império do Sol’, de Steven Spielberg, fez isso com muita competência, mas o que conta é a narrativa inventiva de mostrar a cabeça de uma criança com todas as perdas e vendo seu país entrar em ruínas e ainda permanecer com o coração bom: ainda nas comparações com Cidade de Deus, Agu se parece muito mais com Buscapé do que com Zé Pequeno.

            Idris Elba está soberbo no papel de um comandante que provoca amor e ódio na mesma proporção para o espectador: ao passo que ele poupa a vida de Agu e quer seu país longe dos terroristas, ele praticamente tira a infância dos garotos ao transformá-los em assassinos (alguém se lembrou de ‘Nascido para Matar’?) e tem a cena já clássica em que ele obriga Agu a matar um civil a sangue frio.

            Não seria nada surpreendente se ‘Beasts of no Nation’ fosse para as premiações, tanto nas categorias técnicas, como fotografia, som e montagem, quanto nas principais: Abraham Attah (que interpreta Agu) e Idris Elba são merecedores da indicação de Melhor Ator e em quem sabe, alguma vaga para melhor filme ou diretor?

            Embora não seja um filme perfeito (faltaram discussões e metáforas sobre o comunidade internacional e descaso com o continente africano, muito bem retradados em ‘Hotel Ruanda’ e aqui, com 140 minutos de duração, daria tempo de colocar), ‘Beasts of no Nation’ mostra a força do serviço streaming: sem a preocupação de agradar esse ou aquele investidor e, para o deleite de nós, amantes de cinema, trazer de volta a tradição das obras autorais.

Nota: 9,0

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sábado, 17 de outubro de 2015

Sicario - Terra de Ninguém


Sicario – Terra de Ninguém (Sicario)

Direção: Denis Villeneuve

2015

Com: Emily Blunt, Benicio Del Toro, Josh Brolin, Jon Bernthal

Drama

16 Anos

A guerra sem sutilezas

            O diretor Denis Villeneuve foi descoberto após dirigir o canadense Incêndios, que perdeu o Oscar de Filme Estrangeiro para o dinamarquês Em um Mundo Melhor, mas foi fundamental para sua entrada em Hollywood: em 2013 dirigiu o excelente Os Suspeitos, com Hugh Jackman e Jake Gyllenhaal e no ano passado fez a ótima adaptação do livro de José Saramago, O Homem Duplicado. Todos são ótimos e cada um é ousado à sua maneira, mas não é exagero nenhum dizer que seu trabalho mais ambicioso e o mais recente: Sicario – Terra de Ninguém é uma pequena obra-prima contemporânea e promete ir para as principais categorias no Oscar 2016.

            Na história, uma agente do FBI, Kate Macer (Emily Blunt, que merece estar no Oscar, já que a Academia está em dívida com ela desde ‘A Jovem Rainha Vitória’) trabalha no grupo de antissequestro da instituição, mas é obrigada a acompanhar a missão de derrubar o cartel mexicano de drogas. Kate é uma policial considerada honesta, mas se torna impotente perante a corrupção e a um esquema poderoso. E neste cenário, Kate começa a conviver com os seus demônios pessoais.

            Não é apenas Emily Blunt que faz um bom papel, um destaque é de Benicio Del Toro. Ele já ganhou Oscar por Traffic em 2001 e faz um policial de intensões duvidosas: ao passo que luta contra o tráfico, ele conhece o sistema por dentro e Kate não tem escolha se não confiar nele.

            A falta de confiança de Kate também cai para seu chefe, vivido por Josh Brolin. Foi ele quem recrutou-a para a missão e ao passo que ele faz comentários maldosos pelo fato de Kate ser uma mulher, coloca muita coisa na responsabilidade dela – e não necessariamente ela tem competência para todas.

            A Emily Blunt de Sicario – Terra de Ninguém lembra muito a Maya de A Hora Mais Escura, na qual a mulher deve se provar forte perante uma guerra, ao mesmo tempo que está insegura e sem saber como dar o próximo passo.

            No caso de Kate, sua insegurança é retratada em diversas vezes com a ausência de diálogos e que todas as sensações da personagens se dão pela expressão, o que é muito mérito da atriz.

            Sicario – Terra de Ninguém seria um filme comum nas mãos de um roteirista e diretor qualquer, mas o roteiro de Taylor Sheridan (em sua estreia como roteirista, ele é ator de Veronica Mars e Sons of Anarchy) consegue captar a urgência da guerra e sem estereotipar quem é mocinho e que é vilão, mas ao contrário do que se imagina, ele não tenta humanizar os traficantes: eles são bandidos e ponto. Mas os policiais não são exatamente mocinhos, eles são corruptos e só agem de acordo com seus próprios interesses.

            Outro grande destaque é a trilha sonora de Jóhann Jóhannsson, que às vezes é intensa e às vezes é ausente quando é exigida.

Mas o grande destaque mesmo é a direção eficiente e soberba de Denis Villeneuve. Sua câmera é tensa, jamais cansa o espectador e o faz mergulhar no submundo das drogas e do tráfico de forma intensa, sejam nas tomadas por cima, para dar a impressão de os EUA e México serem um país só, e portanto, iguais em escala de violência e corrupção, nas cenas de tiroteio (com destaque na cena da ponte e na eletrizante meia hora final), na fotografia suja e violenta ou na espetacular cena de abertura, na qual a equipe do FBI liderada por Emily Blunt faz uma missão fracassada de conter um sequestro.

Sicario – Terra de Ninguém não é um produto de entretenimento de Hollywood, quem quer se divertir, deve procurar outra sala de exibição com o clima quase documental e do seu tema, que é do cartel de drogas, se unirmos com a série Narcos, ele se torna quase obrigatório e lançado no ano certo e na hora certa.

Para o público nerd, não deixem de reparar na presença do ator Jon Bernthal como o interesse amoroso de Kate. Ele é o Shane na série The Walking Dead e será o Justiceiro na 2ª temporada da série da Netflix, Demolidor, que estreia ano que vem.

Nota: 10,0

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A Colina Escarlate


A Colina Escarlate (Crimson Peak)

Direção: Guillermo Del Toro

2015

Com: Mia Wasikowska, Tom Hiddleston, Jessica Chastain, Charlie Hunnam, Doug Jones.

Terror

16 Anos

Um nerd chamado Del Toro

            O diretor, produtor e roteirista Guillermo Del Toro é fã assumido da cultura pop e faz questão de colocar isso em seus filmes, desde seus primeiros trabalhos nos anos 90 até seu último filme, Círculo de Fogo em 2013, que foi aclamado por público e crítica e o que não faltou na ocasião foram referência à cultura pop, sobretudo à cultura japonesa.

            E seu mais novo trabalho, A Colina Escarlate (e que título espetacular!) tem muito da marca e coração de Guillermo Del Toro: história sombria, personagens dúbios e, claro, referências.

            A Colina Escarlate é um projeto ambicioso e relativamente barato: foram 70 milhões de dólares de orçamento e a grande maioria disso foi na construção da mansão Sharpe, onde quase nada foi computação gráfica e tudo foi feito por detalhes. Somente um diretor do calibre de Del Toro teria a moral de realizar um blockbuster americano e que tivesse um cenário real, sem fundo verde – e sem o estúdio pressionando para cortar gastos.

            E visualmente, A Colina Escarlate é arrebatador: o figurino é incrível, a mansão é um grande personagem do filme (e até melhor do que alguns atores) e uma bela reconstrução da época. Nisso, A Colina Escarlate já surge como possível favorito ao Oscar de Figurino e Design de Produção.

            Na história, dois irmãos ingleses, Thomas (Tom Hiddleston) e Lucille (Jessica Chastain, ótima no papel!) vão até os EUA por negócios e Thomas acaba se apaixonando por uma aspirante a escritora, Edith (Mia Wasikowska), mas um acaso faz com que Edith more junto com o casal de irmãos na mansão. Lá começam a acontecer coisas estranhas e ela começa a questionar se foi uma boa ideia ir para lá.

            Boa parte da crítica falou mal de A Colina Escarlate, sobretudo por dizer que o roteiro era previsível. De fato, o roteiro não é exatamente original. Quase tudo o que há no filme já foi visto em outros filmes, como o amor impossível entre Thomas e Edith, a cunhada megera, e os costumes da época, mas Del Toro (que também escreve o roteiro) faz isso com uma narrativa diferente e coloca um mistério que leva até o fim.

            A discussão que surge quando se vê A Colina Escarlate é se estamos diante de um filme de terror ou romance. Há um pouco dos dois, o romance vira um conto de terror e lembra muito o filme de Francis Ford Coppola, Drácula de Bram Stocker, e vários outros filmes na qual a casa é o personagem, passando pelo clássico de Stanley Kubrick, O Iluminado ao pop A Casa da Colina.

            Mas se o romance é um pouco previsível mesmo (foi o que tirou a nota 10, infelizmente), o mesmo não se pode dizer do excelente terror que toma conta da tela: as câmeras acompanhando as expressões dos personagens, a maquiagem eficiente (que também deve ir ao Oscar) e a trilha sonora soturna fazem com que A Colina Escarlate seja um terror único. E o melhor: as mortes surreais contém uma brutalidade que é raramente vista, desafiando o limite de o que pode e o que não pode e se não fosse um diretor como Del Toro na direção, dificilmente os fãs de terror seriam agraciados com isso.

            A australiana Mia Wasikowska faz uma mocinha eficiente e sombria, que lembra muito seu papel em Segredo de Sangue e só mostra que ela pode fazer qualquer gênero: desde a fantasia de Alice no País das Maravilhas até esse terror. Tom Hiddleston, que é o Loki do Universo Marvel, faz um papel apenas correto e convencional, mas não compromete o resultado final. Mas o melhor personagem é, indiscutivelmente, o da Jessica Chastain, de irmã fria e calculista ela é um segredo a ser descoberto e sua Lucille se torna mais interessante a cada tomada. Na Hollywood de hoje, Jessica é das atrizes mais requisitadas e não é por acaso.

            A Colina Escarlate não é o melhor filme de Guillermo Del Toro (Círculo de Fogo e Labirinto do Fauno são melhores, por exemplo), mas é um alívio que, com tantas adaptações, franquias e histórias de origem desnecessárias, há um sopro de originalidade e de autoria em Hollywood. E no caso da produção de A Colina Escarlate, embora existam grandes cenários de fundo verde, nada substitui um cenário real. E se vier a indicação ao Oscar pelo Design de Produção, pode inspirar outros a seguirem o mesmo caminho.

Nota: 9,0

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sexta-feira, 16 de outubro de 2015

A Travessia


A Travessia (The Walk)

Direção: Robert Zemeckis

2015

Com: Joseph Gordon-Levitt, Ben Kingsley, Charlotte Le Bom, Clément Sibony, James Badge Dale, Ben Schwartz.

Drama

14 Anos

Corre Philippe, Corre!

            Em 1974 um equilibrista francês chamado Philippe Petit chamou a atenção do mundo ao atravessar as Torres Gêmeas suspenso em uma corda e com as torres ainda em construção. Não bastasse a ousadia e coragem do feito, toda a preparação foi feita à surdina e Philippe contou com amigos, namorada e de seu mestre, Papa Rudy.

            Tudo isso foi contado no documentário O Equilibrista, de 2008, que faturou o Oscar de Melhor Documentário na ocasião.

            Mas, como pouca gente assiste a documentários e essa é uma história fantástica demais para ser ignorada, o diretor Robert Zemeckis dirige, escreve e produz um longa metragem de ficção desta mesma história: A Travessia é baseado no livro ‘To Reach the Clouds’, escrito pelo próprio Petit e tomou algumas liberdades poéticas, mas, ao contrário do que se possa imaginar, essas liberdades funcionam, sobretudo porque mesmo com o público sabendo como a história termina, o roteiro coloca, tanto o protagonista como o grupo, em situações que a coisa pode dar errado: por diversas vezes eles passam por situações de perigo e a desistência é constantemente dita.

            O filme é narrado em 1ª pessoa pelo próprio Joseph Gordon-Levitt (que está em cima da Estátua da Liberdade enquanto narra) e conta desde sua infância em Paris até sua ação no World Trade Center, mostrando suas primeiras apresentações no centro da cidade-luz, na qual muitas vezes ele se apresentava clandestinamente, o não-apoio de seu pai, sua saída de casa por conta disso, sua amizade com o mestre Papa Rudy, aqui vivido pelo Ben Kingsley e seu início de namoro com Annie, que também era artista de rua e começou a acompanhar Petit em sua trajetória.

            Petit teve a idéia de andar sobre uma corda nas Torres Gêmeas após ver um anúncio da construção das mesmas em um dentista, levou meses para arquitetar tudo: viajou para Nova York, se disfarçou de operário, arquiteto, engenheiro, calculou a distância, o tempo, precisava saber como prender as cordas de forma eficiente, enfim, nada poderia dar errado.

            O filme acerta em focar no sonho de Petit e para os próximos anos, pode muito bem funcionar como um filme de auto-ajuda, afinal, para seguir com um sonho, uma idéia, às vezes precisamos burlar as regras do sistema e seguir o coração – ao invés de seguir ordens. E se contarmos os artistas mais geniais da história, independentemente da área, todos fizeram isso.

            Já fazia um bom tempo que o diretor Robert Zemeckis não tinha um sucesso crítico como este, ele começou sua carreira na década de 80, sendo parceiro de Steven Spielberg, mas logo foi criando independência criativa e seu melhor filme até aqui, que é Forrest Gump (tá bom, um dos dois melhores, estando ali empatado com De Volta Para o Futuro) foi o filme que lhe rendeu o Oscar de Melhor Diretor em 1995 e há sim, muitas semelhanças com os dois filmes, ‘A Travessia’ e ‘Forrest Gump’ embora possa soar exagerada essa comparação, elas existem sim: além da já citada narração em off do próprio protagonista, a infância reprimida, o primeiro amor de forma pura (embora Annie e Jenny tenham psicológicos completamente diferentes), a história se superação e a trilha sonora lírica de Alan Silvestri, que assim como em Forrest Gump, é quase um personagem no filme.

            Quem for assistir ao filme em casa, pela internet ou em DVD, vai acompanhar uma grande história, mas o 3D – e o IMAX também – trazem a imersão que o filme necessita com a câmera quase vertiginosa de Zemeckis e assim como em Forrest Gump, mostrando efeitos onde não se nota, como em Petit se equilibrando na corda, o World Trade Center feito por computação gráfica e a boa reconstrução da época. E tudo isso necessita de uma boa profundidade em 3 dimensões, que ‘A Travessia’ faz muito bem.

            Nesse cenário, Robert Zemeckis entra na galeria dos grandes cineastas que usaram bem este recurso: recentemente tivemos Ridley Scott em ‘Perdido em Marte’ e também temos Martin Scorsese em ‘A Invenção de Hugo Cabret’, Alfonso Cuarón em ‘Gravidade’, Ang Lee em ‘As Aventuras de Pi’ e James Cameron em ‘Avatar’.

            ‘A Travessia’ não tem a perfeição de Forrest Gump (o envolvimento familiar ficou enxuto demais no início e ele perde um pouco o ritmo em uma determinada hora), mas foi maravilhoso ver que este cineasta que aprendemos a respeitar e gostar não perdeu a mão de uma boa direção, de trabalhar bem os atores e adaptar uma boa história (que poderia se perder, já que temos a referência do documentário). O público até o perdoa pelas suas animações medianas da década passada.

Nota: 9,0

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