domingo, 20 de abril de 2014

Divergente



Divergente (Divergent)

Direção: Neil Burger

Ano de produção: 2014

Com: Shailene Woodley, Theo James, Kate Winslet, Jai Courtney, Miles Teller, Zoe Kravitz, Maggie Q, Ashley Judd, Tony Goldwyn .

Gênero: Aventura

Classificação Etária: 14 Anos


“Divergente” é fraco como cinema e como adaptação literária.

            Definitivamente, Hollywood sabe explorar um tema até ele ficar repetitivo. Para o bem e para o mal, as adaptações literárias se tornaram quase obrigatórias para os estúdios. E sucesso de literatura não necessariamente quer dizer sucesso de bilheteria. Que o diga “Dezesseis Luas” e “Instrumentos Mortais”, este último, uma grande série de livros, é verdade, mas o filme é fraco. Mas a verdade é que todos querem ser o sucesso de “Jogos Vorazes” na atualidade e os já consagrados “Harry Potter” “Senhor dos Anéis” e “Crepúsculo”. O que os executivos têm que entender é que essas obras são originais e trouxeram algo de novo ao cinema e muitos filmes são um quase plágio de obras consagradas. Até mesmo “Crepúsculo” com todas as suas falhas, trouxe algo de novo ao cinema e não devemos nos esquecer da importância literária que a serie de livros da Stephenie Mayer trouxe ao mundo.

            E agora, em 2014, com o estouro da franquia “Jogos Vorazes”, logo os estúdios resolveram colocar uma adaptação literária quase do mesmo patamar: “Divergente”, baseado em uma trilogia de livros da autora Veronica Roth. Os 3 livros já foram lançados no Brasil e eu, Raphael, só li até agora o 1º livro, que deu nome a esse filme, “Divergente”. Os outros 2 livros, “Insurgente” e “Convergente”, espero ler para os próximos meses.

            E quais foram as impressões lendo o livro? Então, fiquei muito surpreso de forma positiva. Fiquei com receio de ser plágio de “Jogos Vorazes”, principalmente por se tratar de um futuro distópico e ditatorial. Mas, “Divergente”, que não tem nada a ver com a obra da Suzanne Collins, tem muitas qualidades, é um livro absolutamente bom de se ler e a escrita de Veronica Roth é muito competente. Aliás, é uma nova onda – e onda positiva, diga-se de passagem – de novos escritores jovens no mercado da literatura. Inclusive aqui no Brasil, basta ver as obras deliciosas de, por exemplo, Raphael Draccon, Carolina Munhoz e Ana Macedo, entre muitos outros.

            E com uma história tão poderosa como a de “Divergente”, logo a Summit Entertainment, também distribuidora da série “Crepúsculo” viu que esta poderia ser uma nova franquia.

            O problema é que, “Divergente” é fraco, tanto como cinema tanto como adaptação literária. As atuações são fraquíssimas, a direção é amadora e nem a parte técnica salva.

            A história de “Divergente” se passa em uma Chicago do futuro, em que as guerras inexistem e a sociedade se divide em 5 facções: Amizade, Abnegação, Audácia, Erudição e Franqueza. A protagonista, Beatrice (Shailene Woodley) vive na Abnegação, que é uma facção que defende que a vida deve se privar de qualquer vaidade. Ao completar 16 anos, todos são obrigados a fazer o teste, quase como um teste vocacional, para saber em qual facção a pessoa se encaixa. E Beatrice, ao completar 16 anos também faz seu teste. Porém, seu teste dá inconclusivo, o que eles chamam de Divergente. Para não levantar suspeitas, Beatrice escolhe o caminho da Audácia, que são uma espécie de protetores da sociedade, mas, Beatrice, que depois adota o nome de Tris, descobre que escolher a Audácia pode não ter sido uma boa escolha, principalmente pelos testes sub-humanos para fazer parte da facção mas também porque ela descobre que a Erudição, que é uma facção que defende a inteligência e a razão, quer controlar a tudo, diminuindo o poder da Abnegação e transformando a Audácia em um exército.

            Quando eu disse anteriormente que “Divergente” é fraco como adaptação e como cinema é por motivos muito simples: quem leu o livro se sente desolado e o prólogo do filme se passa tão rápido que mal dá para se envolver emocionalmente com a protagonista. Obviamente que uma adaptação cinematográfica não vai seguir o livro à risca, pode faltar algo, desde que tenha uma certa coerência e inteligência por trás da história. Foi o mesmo problema de “O Código da Vinci”, que como se não bastasse isso, respeitou demais o livro que não merecia tanto respeito. Uma adaptação cinematográfica pode e deve mudar conteúdos do livro, afinal, uma adaptação deve ser livre, mas muita coisa faltou nesse filme, como a melhor amiga de Tris, Christina, vivida por Zoe Kravitz, que no livro tem presença onipresente, mas aqui é uma coadjuvante de luxo. E o filme tem um grande problema de interpretação, pois começa com a narração em 1ª pessoa, mas o filme é todo contado em 3ª pessoa, embora focado na Tris.

            E quem não leu o livro? Pois bem, havia um receio da história ficar parecida com “Jogos Vorazes” pelo contexto, mas digo que “Divergente” é, na verdade, mais parecido é com “Crepúsculo”. Sim, é tudo o que vocês não queriam ouvir, principalmente por focar mais no romance de Tris e Quatro, vivido por Theo James. A ditadura no futuro distópico é, portanto, um segundo plano na trama.

            Mas e o elenco? A escolha de Shailene Woodley como Tris foi a pior possível. Ela está em alta em Hollywood, já tem uma indicação ao Globo de Ouro por “Os Descendentes” em 2012 de Atriz Coadjuvante e está, agora, em 3 franquias. Além dessa, “Divergente”, ela será a Mary Jane em “Homem-Aranha” e será a protagonista de outra adaptação literária, “A culpa é das estrelas”, com previsão de estrear em Junho nos cinemas.

            Vendo “Divergente”, observa-se que ela é uma atriz muito limitada e que, infelizmente, não tem a força que um filme deste tamanho exigia. Assim como Kristen Stewart em “Crepúsculo”, sua atuação é, no máximo, mediana. Sua atuação boa em “Os Descendentes”, foi portanto, uma sorte do destino por estar ao lado de nomes como George Clooney e do diretor Alexander Payne.

            O restante do elenco não ajuda, em especial o elenco jovem. Alguns merece, aliás, indicações ao troféu Framboesa de Ouro, como o próprio Theo James, que interpreta Quatro, que está mais preocupado em fazer pose de galã do que em atuar e mesmo quando ele é exigido, como quando ele é manipulado pela Erudição, ele não consegue mostrar carga dramática nenhuma. Aliás, seu romance com Tris não empolga. Ele é arrogante e de início destrata a protagonista e depois ele vira o herói e o queridinho da vez. Fica difícil torcer pelo casal. O elenco jovem também é péssimo, como Jai Courtney, como Eric e Miles Teller como Peter também infelizmente estão mal. E é bom eu lembrar do nome dos dois agora, Miles Teller e Jai Courtney, que amanhã eu já devo esquecer. Assim como já me esqueci do rosto.

             Mas a decepção maior fica mesmo com o diretor, Neil Burger, um bom diretor, que fez “O Ilusionista” e “Sem Limites”, que é um bom cineasta e seus filmes tinham como característica maior a loucura e até onde o ser humano pode chagar. Aqui, ele está mais contido, mais por culpa do estúdio, que queria um produto mais adolescente e menos ousado e menos por culpa de seu talento.

            O filme só fica bom mesmo com a vilã, Kate Winslet, essa sim, que dá um tom maior à história e sua ditadora Jeanine é um alívio na, digamos, “crepusculada” que o filme dá. Seu método de controlar a mente humana, em transformar os integrantes da Audácia em soldados sem emoção é de arrepiar e quando ela aparece em cena, o filme solta faíscas.

            Ah, com o sucesso nos EUA e no Brasil, “Insurgente” vem logo aí em 2015.
             

Nota: 3,0


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domingo, 13 de abril de 2014

Capitão América 2 - O Soldado Invernal



Capitão América 2 – O Soldado Invernal (Capitain America – The Winter Soldier)


Direção: Anthony e Joe Russo

Ano de produção: 2014

Com: Chris Evans, Scarlett Johansson, Anthony Mackie, Robert Redford, Samuel L. Jackson, Emily VanCamp.

Gênero: Ação

Classificação Etária: 12 Anos


Capitão América 2 é o mais denso e o melhor filme da Marvel Studios.

            Desde 2008, quando foi lançado o primeiro “Homem de Ferro”, a Marvel resolveu dar uma reformulada, criar um estúdio próprio e também um universo próprio, e o cinema dos quadrinhos nunca mais foi o mesmo: muitas adaptações boas e muitas adaptações ruins também surgiram, muitos universos novos e os quadrinhos viraram a palavra de ordem dos estúdios, basicamente de 3 estúdios: obviamente da Marvel Studios, mas também a Warner e sua DC Comics e a Fox com “X-Men”. Mas, em matéria de arrecadamento, a Marvel Studios passa na frente: só “Os Vingadores” e “Homem de Ferro 3” faturaram, juntos, mais de 2 bilhões de dólares ao redor do mundo. E em matéria de qualidade também a Marvel passa na frente: de todos os filmes até agora do estúdio, a única derrapada foi com “Homem de Ferro 3”.

            E o divisor de águas desse universo foi, claro, “Os Vingadores”: agora, todas as obras da Marvel, seja filme ou série, devem amarrar alguma coisa com o mundo Marvel, por isso que “Homem de Ferro 3” foi tão ruim: parecia que era um filme passado em outro mundo e independente de “Os Vingadores”, erro corrigido em “Thor 2 – O mundo sombrio”.

            Mas há um problema nisso: depois do fenômeno que foi “Os Vingadores”, há uma preocupação do estúdio em entregar um produto que se iguale ou compare à união dos heróis e ainda ser divertido como filme de ação e com um roteiro bom que se é exigido. “Thor 2 – O mundo sombrio” já havia feito isso ano passado, em explorar o universo e corrigir as falhas do primeiro filme e agora, em 2014, a Marvel dá um passo à frente e realiza: “Capitão América 2: O Soldado Invernal”.

            O primeiro filme em 2011 foi muito bacana, mostrou de forma honesta a origem do herói e foi muito arriscado no sentido de tentar não ser maniqueísta. E conseguiu. Foi muito legal de ver o herói criado pelo ideal norte-americano para combater o nazismo.

            Mas, após os eventos ocorridos no primeiro filme, o Capitão ficou 70 anos congelado, voltando ao nosso mundo atual e participando dos acontecimentos de “Os Vingadores”.

            Aqui, “Capitão América 2: O Soldado Invernal”, se passa 2 anos após os eventos de “Os Vingadores”, com o nosso herói se acostumando ao mundo de hoje. Após um atentado em seu apartamento, ele descobre que a S.H.I.E.L.D foi corrompida pela HIDRA, empresa que financiava o nazismo e a própria S.H.I.E.L.D agora persegue o Capitão por ele ser uma “ameaça ao sistema”. Junto com isso, há a figura do Soldado Invernal, antigo amigo de Steve Rogers, Bucky, que, do mesmo jeito que Rogers foi criado pelos ideais americanos, Bucky foi criado pelos ideais soviéticos. Para quem não sabe, Bucky era o melhor amigo de Rogers no passado, mas, aqui, ele é uma verdadeira máquina de matar e sua memória foi apagada. Além de lidar com a S.H.I.E.L.D inteira atrás dele, com toda a corrupção e jogo de interesses, o Capitão América agora também tem que equilibrar a razão de confrontar com um inimigo mais forte do que ele e ainda a emoção de ver que seu melhor amigo agora é uma máquina no sistema conspiratório. O Steve Rogers/Capitão América, também tem amigos, além do líder da S.H.I.E.L.D, Nick Fury (Samuel L. Jackson, que parece estar mais se divertindo com o papel a cada filme), também de sua nova companheira, a Natasha Romanoff/Viúva Negra (Scarlett Johansson), que, desta vez, tem um papel de maior destaque em vista do que foi “Homem de Ferro 2” e “Os Vingadores” e seu amigo Sam (Anthony Mackie), que depois vira o herói Falcão.

            Além do Falcão, outros novos personagens entraram na história, com um destaque para Robert Redford como o agente Alexander Pierce. É mágico ver essa grande lenda do cinema em um filme deste tamanho e ainda com um papel de destaque. Seu papel de empresário corrupto é das melhores coisas do filme. E seus diálogos com o incorruptível Nick Fury são de arrepiar. Outra personagem que merece ser citada é Sharon Carter/Agente 13, vivida pela Emily VanCamp. Para quem não sabe, ela é a protagonista da ótima série “Revenge”. Seu papel é pequeno, é verdade, mas sua personagem deve crescer para os próximos filmes.

            Aliás, o fato de Sharon Carter ter um papel pequeno aqui foi uma licença poética do roteiro: nas HQs do Soldado Invernal, Sharon Carter ou Agente 13 que é a parceira de Rogers e os quadrinhos até sugerem um envolvimento amoroso. Aqui no filme, sua parceira é a Viúva Negra, o que fez todo o sentido, afinal, com todo o universo Marvel já estabelecido, com uma personagem já conhecida do grande público e com uma grande atriz que é a Scarlett Johansson, não faria sentido em ter que explicar uma nova personagem em um filme que já tem preocupações demais. O filme não sugeriu um envolvimento amoroso entre a Viúva e o Capitão. Há uma cena de beijo dentro de um shopping, mas não foi de fato afetivo, mas uma solução para a perseguição dos agentes da S.H.I.E.L.D.

            O filme tem vários alívios cômicos, é claro, mas, arrisco dizer que esse é o filme mais sério da Marvel Studios, e o que mais investe em relações humanas. Havia toda a história do Capitão América em se adaptar ao mundo novo, isso é citado, obviamente, mas, felizmente, não explorado. Tem o apelo emocional do confronto do Capitão e seu melhor amigo, sem apelar para emoções fortes ou o pieguismo, mas só o olhar de Chris Evans quando se depara pela primeira vez com seu amigo já diz tudo. Emoções fortes mais guiadas pela razão são difíceis ver em um filme de super-herói. Até onde a memória alcança, a última vez foi no final espetacular de “Homem-Aranha 2”.

            Chris Evans, aliás, está cada vez melhor como ator. Ele não começou a carreira muito bem, é verdade, ele mais fazia pose de galã e mais se preocupava em aparecer do que atuar, como na comédia “Não é mais um besteirol americano”, mas, principalmente nos dois filmes do Quarteto Fantástico, em que ele, assim como a Jessica Alba, quiseram ser mais famosos do que os filmes, e, talvez, por isso, Quarteto Fantástico não tenha sido uma adaptação de quadrinhos tão legal como Capitão América é.

            Pela primeira vez em um filme da Marvel, temos um tema tão delicado e complexo como a corrupção. A figura do mal, se assim podemos dizer, é, claro, de Robert Redford. Ele não só faz o filme soltar mais faíscas do que já tem, mas seu olhar frio e calculista quando ele é cobrado em sua sala e em suas reuniões holográficas são ótimas. E não devemos esquecer da cena da lavagem cerebral que ele impõe e obriga ao Soldado Invernal, ou Bucky, para quem preferir. A cena em que todos os funcionários da S.H.I.E.L.D descobrem que a empresa foi corrompida, em que todos apontam armas para todos, é de gelar a espinha.

            O elenco está perfeito, assim como Chris Evans, Scarlett Johansson e Robert Redford, já citados, também das ótimas atuações de Anthony Mackie como Falcão. Ele já demonstrou a carga dramática em “Guerra ao Terror”, da Kathryn Bigelow e agora tem a chance de ser mais conhecido do grande público. Emily VanCamp, a Emily da série “Revenge”, que, embora tenha um papel menor, é muito bom vê-la fora da série e também com agora uma chance de se revelar no cinema. E, claro, outro destaque é Sebastian Stan, que interpreta o Soldado Invernal. Ele, assim como Chris Evans, só fazia pose de galã na série “Gossip Girl”. E aqui, com um papel mais exigente, ele mostrou de fato tão bom ator que é e como parecer assustador na presença do Capitão América.

            Mas, em se tratando de um filme de super-heróis, e as cenas de ação? Estão as mais perfeitas possíveis, bem como o uso do 3D. aqui, a tecnologia em 3 dimensões não é gratuita nem há objetos arremessados à plateia, como muito filme faz: aqui, o 3D é de fora para dentro, dando uma impressão de maior profundidade, com destaque para duas cenas de ação, que são duas perseguições de carro: a cena, logo nos primeiros momentos do filme, em que Nick Fury é perseguido pela polícia de Nova York, mas, principalmente, na sequência em que o Capitão, a Viúva e o Falcão estão dirigindo e o Soldado Invernal os interrompe e se inicia o tiroteio, resultando na “prisão” dos heróis.

            Espero, de verdade, que essa ascensão dos filmes de quadrinhos não fique restrita só à Marvel, tomara que a DC Comics, por exemplo, já se mexa e comece a se mexer e que os lucros da Marvel sirvam de exemplo. Eles têm Liga da Justiça, e o filme nem saiu do papel, por exemplo. Eles farão “Batman VS Superman” com estreia prevista para 2016. Se eles não fizerem mais nada até lá, verão a Marvel lucrar mais e, infelizmente, poderão ficar esquecidos até lá. Espero que seja essa a ressurreição da DC.

            Até lá, vida longa aos quadrinhos.
             

Nota: 10,0

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terça-feira, 8 de abril de 2014

Shame



Shame (Idem)

Direção: Steve McQueen

Ano de produção: 2011

Com: Michael Fassbender, Carey Mulligan.

Gênero: Drama

Classificação Etária: 18 Anos


“Shame” é ótimo, mas, infelizmente, foi vendido da forma errada.

            Um pouco antes de o diretor Steve McQueen ficar mundialmente famoso pelo premiado “12 anos de escravidão”, ele fez um filme profundo, totalmente autoral e feito para chocar a opinião pública: Shame, que gerou muita polêmica pois apresentava a nudez frontal do protagonista, Michael Fassbender. Mas o filme não se resume a isso: é uma odisséia sexual, a história de um homem desesperado e ao mesmo tempo tendo que se impor no papel masculino, ou ainda, o convívio de egos entre irmãos.

            Na história, Brandon (Fassbender, ótimo no papel) é um executivo bem-sucedido de Nova York, mas que tem um distúrbio: é viciado em sexo. Mas viciado mesmo. Não é cinismo do protagonista. No filme, fica claro que seu problema é físico e psicológico. Ele caça mulheres no metrô, transa invariavelmente com prostitutas, se masturba em banheiros públicos e o computador de seu trabalho é cheio de pornografia. A coisa muda um pouco quando sua irmã, Sissy (Carey Mulligan), chega sem avisar em seu apartamento. Ela não tem onde morar, não tem para onde ir e acaba se tornando um fardo a Brandon, embora muitas vezes sem querer.

            Foi difícil para Steve McQueen vender “Shame” aos festivais sem focar nas cenas de nudez e sexo. Não só Fassbender aparece com nudez frontal, mas Carey Mulligan (indicado ao Oscar em 2010 por “Educação”) também, assim como todas as mulheres que Brandon tem relações ao longo do filme. Mas o filme não fez feio: foi aplaudido em Cannes e Fassbender foi indicado a Melhor Ator no Globo de Ouro. Provavelmente por causa do conteúdo de “Shame”, passou despercebido no Oscar.

            O filme é praticamente uma odisséia sexual, no estilo Stanley Kubrick em “De olhos bem fechados”, principalmente quando acompanhamos a trajetória do homem desesperado em busca de prazer, em uma Nova York soturna e com uma trilha sonora de arrepiar e dar um clima, tanto de suspense, como de ousadia, a mais para o filme.

            O interessante, também, é que “Shame” não se resume apenas a sexo, mas também na convivência (ou falta dela) entre os irmãos, Brandon e Sissy. Os dois não se entendem, possivelmente por alguma intriga do passado (que não fica claro na trama), mas aqui, Sissy é que parece ser a mais humana da história, não por ser boazinha (que de boazinha não tem nada, ela, por exemplo, dorme com o chefe de Brandon), mas por ser verdadeira. Enquanto Brandon esconde seus vícios, principalmente para manter o status no mundo dos negócios, Sissy é mais espontânea, é às vezes até mais carinhosa no que diz ao amor fraternal e até joga na cara de Brandon em uma discussão: quem é você para falar de sexo comigo?

            A cena dela cantando “New York, New York”, de Frank Sinatra, em um restaurante, e com um ritmo completamente diferente da música original, é linda, muito diferente do desfecho da personagem, que de lindo não tem nada, mas fez todo o sentido considerando o estado em que os ânimos dos irmãos estavam.

            “Shame” não é exatamente um filme-cabeça, nem tem o brilho que “De olhos bem fechados” teve, mas é uma grande satisfação ver um diretor com um filme vencedor de Oscar e com um ator que vive um ícone dos quadrinhos no cinema, no caso, Magneto, enquanto ainda desconhecidos do grande público. E considerando agora o sucesso de Steve McQueen e de Michael Fassbender, será difícil vê-los em um filme tão denso, em especial Fassbender, que logo estará nas telonas em “X-Men: dias de um futuro esquecido”


Nota: 9,0

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sexta-feira, 4 de abril de 2014

Noé



Noé (Noah)

Direção: Darren Aronofsky

Ano de produção: 2014

Com: Russell Crowe, Jennifer Connelly, Emma Watson, Ray Winstone, Logan Lerman, Anthony Hopkins.

Gênero: Épico

Classificação Etária: 14 Anos


“Noé” fala com o grande público sem perder a tradição bíblica

            Aronofsky é um cineasta como poucos e seu cinema ultrapassa os limites de o que é real, o que é irreal e até onde a imaginação humana pode ir. Seu filme mais conhecido é “Cisne Negro”, que deu à Natalie Portman seu merecido Oscar em 2011. Cisne Negro é um grande filme, com certeza, mas, seu melhor filme ainda é “Réquiem para um sonho”, que mostra um lado bem obscuro da espécie humana.

            Mesmo com um currículo desses, havia certa desconfiança da ideia de ele filmar um blockbuster, afinal, estamos falando de um sujeito conhecido no cenário independente. E principalmente se esse blockbuster tem um pano de fundo bíblico. Dificilmente alguém se arrisca para fazer um filme de tema religioso, mas, quando sai, o resultado muitas vezes é um sucesso, como “A paixão de Cristo”, de Mel Gibson, em 2004, ou o polêmico “A última tentação de Cristo”, de Martin Scorsese. E o cinema estava precisando mesmo de um grande filme religioso exatamente para mostrar para as novas gerações uma história clássica sob um ponto de vista diferente.

            E nesse ponto, “Noé” acerta em cheio.

            É uma superprodução, sim, há muitos efeitos e computação gráfica, com batalhas dignas de “O Senhor dos Anéis”, mas fala de uma história que, segundo a Bíblia, ocorreu antes de Cristo. E com uma linguagem acessível e inteligente, seja para o pessoal mais religioso ou para quem vê o filme apenas como entretenimento. É entretenimento sim, mas dos bons, com um roteiro sem exageros e, principalmente, sem tomar partido de nenhuma ideia levantada. Tudo isso com a competência do roteiro do próprio Aronofsky e de Ari Handel, os mesmos de “Cisne Negro” e “O Lutador”.

            Na história, Noé (Russell Crowe) recebe uma mensagem de Deus (que no filme é apresentado como “Criador”) para construir uma arca e, assim, salvar todos os animais e sua família do mundo do dilúvio e a espécie humana, que fez mal ao mundo, deve deixar de existir.

            Essa é a história que está na Bíblia, mas Aronofsky tomou algumas liberdades poéticas, como o personagem de Tubal-Cain, (Ray Winstone), que foi criado pelos roteiristas e aqui representa a arrogância e ganância humana. Temos também a personagem de Ila (Emma Watson), namorada de Shem e filha adotiva de Noé. Na Bíblia, jamais é citado o nome dela, assim como a esposa de Noé, aqui, com o nome de Naameh (Jennifer Connelly, em sua 2ª contribuição com Aronofsky, a 1ª foi em “Réquiem para um sonho”).

            Como o roteiro não toma partido de praticamente nada, o Aronofsky fez, assim como fez em seus outros filmes, deixar para o público tomar suas decisões e conclusões. Nem o próprio Criador, nem Noé são tão incontestáveis como as religiões dizem. Afinal, o homem é ou não é a razão da maldade do mundo? A espécie humana deve ser extinta? A se merece ser extinta, Ele é puro ou vingativo? O Noé, de Russell Crowe, é basicamente um pouco de tudo. Ele tem que seguir o legado e chamado do Criador, mesmo que isso signifique o fim do homem e não permitir que haja mais gerações humanas (as sequencias, da metade para o fim, em que Ila fica grávida e Noé sugere a morte dos bebês são angustiantes).

            Mas e o elenco? Bom, aqui, Aronofsky trabalha só com os melhores. Russell Crowe, claro, dispensa comentários. Ele já foi o Gladiador e agora representa, com muita competência, um personagem épico. Jennifer Connelly, que estava sumida, é verdade, faz uma esposa segura, eficiente e até independente. Aliás, esta é a 2ª vez que os dois fazem um casal – a 1ª foi em “Uma mente brilhante” – e a química deles é perfeita.

            E o que dizer de Emma Watson? Já tem alguns filmes em que ela já deixou o estigma da bruxinha Hermione de Harry Potter e está em papéis mais densos e exigentes, como a doce Sam de “As vantagens de ser invisível” e a esperta Nicki de “The Bling Ring – A gangue de Hollywood”, da Sofia Coppola. Aqui, ela é Ila, que representa, ao mesmo tempo, a moça tradicional de família e a mulher quase independente que pode representar o futuro da humanidade.

            “Noé” é um filme quase perfeito. É uma superprodução e podem aparecer problemas, mas, nesse caso, o maior problema dele é também a maior virtude: a computação gráfica e a tecnologia 3D. Quase não há profundidade, se puder, veja em 2D, mas a ressalva maior fica por conta do uso do computador: embora haja momentos bons, como a história da Criação, que Noé conta para a sua família, com belas imagens da origem do mundo, lembrando muito o jogo de imagens usado em “Réquiem para um sonho”, a maior parte do tempo, os efeitos estão tão artificiais que incomodam a platéia, como a floresta nascendo ao redor da casa de Noé, mas a decepção ficou mesmo com as criaturas digitais chamadas “Guardiões”, com um péssimo uso da computação gráfica e CGI.

            Mas, mesmo com essa ressalva, não há dúvidas das qualidades de “Noé” e devemos aplaudir a iniciativa de resgatar a Bíblia para as novas gerações, além de ser um grande incentivo aos nossos jovens de buscar histórias clássicas.


Nota: 9,0


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quinta-feira, 3 de abril de 2014

Loucamente Apaixonados



Loucamente Apaixonados (Like Crazy)

Direção: Drake Doremus

Ano de produção: 2011

Com: Felicity Jones, Anton Yelchin, Jennifer Lawrence.

Gênero: Romance

Classificação Etária: 12 Anos


“Loucamente Apaixonados” é um romance às antigas com um delicioso sabor pop

            Existe certo preconceito com o gênero romance hoje em dia. E, fundamentalmente, estamos tão acostumados com um jogo de interesses, seja ele financeiro ou sexual, que muita gente até repele algo puro e verdadeiro. Mas, o amor como ele deve ser existe sim e persiste nos dias de hoje, seja no dia-a-dia, mas, também nas artes. Quem, assim como eu, cresceu lendo e vendo “Romeu e Julieta” ou o Romantismo brasileiro, sente falta de alguma obra assim atualmente e sente que quando há alguma história de um casal, o contexto já parte para o lado sexual e do escracho.

            Não que isso seja necessariamente ruim, até porque o sexo ou o humor têm que combinar com o contexto. Por exemplo, “Amor e Outras Drogas”, com Anne Hathaway, é uma comédia romântica cheia de piadas de duplo sentido, mas fez todo o sentido em se tratando de uma obra como pano de fundo a criação do viagra, no final dos anos 1990. E também temos a comédia romântica “(500) dias com ela”, com Zooey Deschanel, que de romântico não tem nada, mas é muito verdadeiro e humano. Mas, o amor lírico não deve ser esquecido, principalmente para as novas gerações de jovens educados pela internet.

            E no quesito de amor lírico, “Loucamente Apaixonados” é o filme certo e na hora certa, além de resgatar o espírito do romance sem esquecer o clima de juventude, afinal, é um amor entre dois jovens.

            “Loucamente Apaixonados” ganhou, em 2011, o prêmio do Júri no Festival de Sundance, especializado em filmes alternativos – e com méritos, exatamente por ser um filme simples e quase sem recursos. Há duas atrizes, Felicity Jones e Jennifer Lawrence, que não eram exatamente estrelas na época e se tornaram com o tempo – em especial Jennifer – que hoje é a atriz mais requisitada de Hollywood.

            Na história, temos um casal de jovens, Jacob e Anna. Ele é americano e ela é inglesa. Ela viajou a estudos para os Estados Unidos e conhece Jacob. Os dois ficam juntos durante o tempo em que Anna está em solo americano, mas quando é chegada a hora de voltar à Inglaterra, ela não consegue esquecê-lo. O casal tem que aprender a se conviver à distância e também a conviver com suas ausências, sem esquecer o sentimento, mesmo com o envolvimento com outras pessoas, no caso, Jacob se envolve com a americana Samantha (papel da Jennifer).

            Não me recordo de uma química tão eficiente no cinema como desses dois. Eles parecem feitos um para o outro, inclusive na vida real. A trilha sonora é perfeita, assim como as locações e a fotografia intimista.

            O filme acerta, também, em colocar o tom certo para cada situação: há momentos doces do casal e há as cenas de sexo, sem explorar nenhum dos dois lados.

            “Loucamente Apaixonados” não é um filme longo, e muito menos arrastado. Merece ser visto por qualquer casal, seja jovem ou adulto, em início de namoro e porque não em um relacionamento duradouro, pois, como o filme demonstra, não há limites para o amor – e nem a distância pode separar.


Nota: 9,0


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