sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Cinquenta Tons de Cinza


Cinqüenta Tons de Cinza (Fifty Shades of Grey)

Direção: Sam Taylor-Johnson

Ano de produção: 2014

Com: Dakota Johnson, Jamie Dornan, Jennifer Ehle, Marcia Gay Harden.

Gênero: Romance

Classificação Etária: 16 Anos


Livro erótico vira romance insosso

            Grandes histórias podem nascer quando menos se espera. Stan Lee criou os X-Men, lá nos anos 1960 porque sua esposa havia sugerido. A escritora brasileira Carolina Munhoz começou a escrever ‘A Fada’ não como um livro de fato, mas como um pequeno conto, daí que, com o material que ela tinha nas mãos, viu que poderia prolongar mais sua história.

            Existem casos, porém, em que uma pessoa é tão fã daquilo que consome que cria histórias paralelas baseadas no mesmo universo. São os chamados “fanfictions”. Muita gente faz isso e não há nada de errado. Eu mesmo fazia isso quando era criança. Fiz isso com ‘De Volta para o Futuro’, ‘Forrest Gump’ e ‘ET’. Como não existia computador na época, fiz tudo em um caderno que se perdeu com o passar dos anos.

            Mas, em 2009, uma mulher chamada Erika Leonard James, casada e com 2 filhos adolescentes, fez uma fanfiction de ‘Crepúsculo’. Ela é apaixonada pela saga, mas viu que a história estava inocente demais e que precisava de algo mais adulto. Em teoria, a idéia é a mesma: a moça ingênua se apaixona pelo sujeito “inatingível”, mas que tem costumes peculiares. Mas, desta vez, não temos um vampiro que brilha no sol, nem lobisomens. Desta vez é a moça virgem que se apaixona pelo milionário que tem fetiches pelo controle e sadomasoquismo. E daí que nasceu ‘Cinquenta Tons de Cinza’.

            No começo foi igual ao livro da Carolina Munhoz: era para ser mais uma conto de fã, mas Erika se empolgou tanto escrevendo que não virou apenas um livro, mas uma trilogia. Além de ‘Cinquenta Tons de Cinza’, ainda teve ‘Cinquenta tons mais escuros’ e ‘Cinquenta tons de liberdade’. Se juntarmos os 3 volumes, temos cerca de 1200 páginas e 100 milhões de cópias vendidas no mundo inteiro.

            E agora Erika Leonard James é simplesmente E. L. James, exatamente para deixar sua “marca” e uma clara referência à J. K. Rowling, autora da série Harry Potter. O que foi totalmente desnecessário e uma manobra mais populista de vender seu produto: o contexto em que J. K. Rowling começou a escrever Harry Potter era completamente diferente, pois praticamente não havia mulheres escritoras, ainda existia preconceito e ela só usou suas iniciais para ser bem aceita no mercado literário. Agora com Crepúsculo, Jogos Vorazes e Divergente, o mercado está mais aberto a todo o tipo de literatura, seja ela infantil, adulta, masculina e feminina e Erika não tinha nada que colocar suas iniciais.

            O pior problema, porém, não é apenas este: ‘Cinquenta Tons de Cinza’ é uma literatura de mau gosto, um grande ultraje e uma escrita muito amadora. Com algumas páginas lidas, fica claro que não teve nenhum cuidado com a linguagem e como todo bom livro que se preze, não permite ao leitor sonhar ou pensar sobre o que está descrito nas páginas.

            Quando ouvi falar em ‘Cinquenta Tons de Cinza’ a primeira vez, em 2012, eu não sabia do real conteúdo, mas logo sabia do incrível fenômeno, pelos comentários e pelo altíssimo público feminino que abraçou a idéia. Até hoje temos muita gente lendo-o em público, no metrô e por aí vai.

            Não estou condenando quem gosta, mas essa idolatria é algo perigoso, pois se temos um sujeito milionário, dominador, segundo ele mesmo, e que sente prazer com a dor feminina, é no mínimo estranho que, com tudo o que o mundo evolui, com os direitos femininos conquistados, a mulher mais independente e cada vez mais forte no mercado de trabalho, se sinta representada na pele da protagonista, Anastasia Steele.

            E não tem jeito: ‘Cinquenta Tons de Cinza’ está aí para ser amado ou odiado. Quem o defende, fala como se fosse a religião. Quem o critica, cita tudo o que foi dito acima.

            Quando ao filme, o problema estava mais na pré-produção do que na realização em si: com um tema tão explosivo como este, era difícil escolher atores para os papéis principais. Para viver Anastasia, o papel foi sugerido a Emma Watson (a Hermione de Harry Potter que, inteligentemente, recusou!) e para Christian Grey, Ryan Gosling foi sugerido.

            Os papéis acabaram ficando com Jamie Dornan como Grey, e Dakota Johnson (filha de Melanie Griffith), que não foi exatamente uma escolha ruim: para um papel tão intenso como este, era muito mais difícil convencer uma estrela hollywoodiana do que um ator desconhecido, que pode, inclusive, dar mais visibilidade aos dois quanto à carreira, mas o risco de ficarem marcados apenas por tais papéis é altíssimo.

            Além disso, a maior dificuldade mesmo foi a escrita do roteiro e a forma de como a história para o cinema seria colocada em tela e se o conteúdo erótico e sádico do livro realmente fosse adaptado.

            Mas toda a polêmica foi pura jogada de marketing: a narrativa erótica foi trocada por um romance insosso, sem química alguma, com uma condução de história que muito se assemelha com Crepúsculo, no amor inatingível, na dúvida da mocinha em ceder ou não, e que provoca mais risadas do que outras reações. As cenas de sexo são raras e mal feitas e que mais se parecem com filmes de baixo orçamento do que com essa produção milionária e, assim como no livro, que foi escrito por uma fã sem critério algum, aqui, o roteiro parece que foi escrito também sem critério e sem respeitar a linguagem cinematográfica.

            Portanto, quem esperava ver um novo ‘Instinto Selvagem’, ‘Corpos Ardentes’, ou qualquer thriller erótico famoso, pode esquecer.

Cinema e literatura são mídias diferentes, e a livre adaptação é bem-vinda. Nem a autora levou a sério e porque raios o roteiro levou?  A dúvida mesmo era se estávamos vendo um conto de fadas ou uma comédia. As altas risadas durante a sessão mais se assemelhavam com a ridicularização do contexto do que a proposta.

            A diretora Sam Taylor-Johnson (esposa de Aaron Taylor-Johnson, que será o Mercúrio em ‘Os Vingadores 2’) pouco pode fazer com o que ela tinha nas mãos e fez um filme protocolar onde a palavra final era dos produtores.

            Ciente do sucesso que o filme faria de qualquer jeito, seu desfecho se dá em qualquer lugar e a platéia fica sem saber o que viu nas 2 horas em que se passaram, lembrando muito o desfecho sem rumo de ‘A Bússola de Ouro’.

E o estúdio já confirmou que a continuação, ‘Cinquenta tons mais escuros’, vai estrear em fevereiro de 2016.

Só espero que não dividam ‘Cinquenta tons de liberdade’, o 3° livro, em dois filmes.

Nota: 0,0

Imagens:







Trailer:

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