terça-feira, 19 de maio de 2015

Bicho de Sete Cabeças


Bicho de Sete Cabeças

Direção: Laís Bodanzky

Ano de produção: 2001

Com: Rodrigo Santoro, Othon Bastos, Cássia Kiss, Caco Ciocler.

Gênero: Drama

Classificação Etária: 16 Anos


Um grito com uma câmera na mão

            Já fez 14 anos que ‘Bicho de Sete Cabeças’ chegou aos cinemas brasileiros e olhando para trás parece que a coisa não mudou muito: os grandes filmes nacionais ficam restritos aos festivais e se estréia na telona, é em um circuito muito limitado.

            ‘Bicho de Sete Cabeças’ começou sendo exibido em vários festivais pelo Brasil até receber prêmios pelos mesmos, como em Brasília e Recife, foi conquistando a crítica até estrear sem fazer muito barulho, mas ganhando o boca-a-boca. E revelando esse talento chamado Rodrigo Santoro. Ele já atuava em novelas e minisséries da TV Globo, sempre de coadjuvante, mas foi o grande Paulo Autran que o recomendou para a diretora Laís Bodanzky que o colocasse como protagonista de seu novo projeto.

            Ou seja, devemos agradecer à diretora e ao Paulo Autran o fato de termos um grande ator brasileiro como Santoro em blockbusters como ‘300’ e ‘Simplesmente Amor’.
            O elenco de apoio também é competente, com Cássia Kiss fazendo a mãe de Santoro e Othon Bastos como o pai. E por se tratar de um filme feito a mais de uma década, alguns atores até então em início de carreira já mostram que poderiam ser grandes, como Caco Ciocler fazendo um interno do hospital psiquiátrico e Luis Miranda (que fez A Grande Família) como um dos enfermeiros.

            Na trama, baseada em uma incrível história real, temos um adolescente chamado Neto (papel de Santoro), que possui comportamento rebelde na escola, em casa e na rua, possui um pai carrasco, que está mais preocupado com o seu time do que com o crescimento do seu filho e uma mãe mais flexível, porém preocupada. O comportamento rebelde de Neto vai ficando mais acentuado com o tempo, ele começa a sair mais a noite, é preso quando resolve pichar um muro (mas solto depois de fiança), mas após seu pai descobrir que ele fuma maconha, o coloca em uma clínica para deficientes químicos.

            Mas o que deveria ser a solução e recuperação de Neto acaba sendo um problema maior: o lugar é todo projetado para deixar o paciente pior do que estava e os internos são apenas números – isso quando não são sofrem maus tratos, com direito a eletro choque.

            Na época de seu lançamento, ‘Bicho de Sete Cabeças’ foi comparado pelos críticos aos grandes filmes subversivos do cinema americano e inglês, como ‘Trainsportting – Sem Limites’ e ‘Kids’, e tem motivos para isso: são cerca de 90 minutos perturbadores, onde o espectador praticamente não tem tempo de respirar e acompanha o ritmo frenético da narrativa, fruto de uma câmera poderosa (quase documental), uma grande fotografia e montagem rápida. Percebam na câmera acompanhando a correria e loucura do protagonista, é quase como se estivéssemos acompanhando a mente sem limites dele.

            A diretora Laís Bodanzky fez grandes filmes depois, como o boêmio ‘Chega de Saudade’ em 2007 e ‘As Melhores Coisas do Mundo’, em 2010, além de ter produzido a grande animação brasileira ‘Uma história de amor e fúria’, mas seu melhor filme permanece este aqui.

            Algumas questões abordadas no filme merecem destaque e podem ser temas de debate e reflexão: todo filho merece atenção e ser ouvido, principalmente se ele for adolescente, que é uma fase complicada da vida e é onde os pais devem redobrar a atenção dos filhos, seja com as más companhias ou os lugares em que ele freqüenta e vemos aqui no filme um pai ausente na vida de Neto, que aparentemente não conhece seu filho, age somente de acordo com seu ego e na hora em que ele mais precisou de um mínimo de carinho que se exige de um pai, ele o entrega para uma clínica – e assiste a cena em que ele é internado com aprovação e descaso (e que show de atuação de Othon Bastos). E como se não bastasse, temos a velha e incômoda dúvida: será que os pais têm seus filhos preferidos? Segundo o roteiro do filme (e, infelizmente, segundo a vida real), muitos têm sim: a irmã estudiosa que trabalha em um escritório recebe o carinho do pai, já o irmão rebelde, é destratado sem pudor.

            E não devemos nos esquecer do sistema, que deixa a pessoa ainda pior do que entrou, que além de praticamente torturar o paciente, ainda há a questão da corrupção: em uma das cenas o médico principal do hospital psiquiátrico fala ao telefone que “o local tem mais de 400 pacientes e que podem vir 500, o importante é receber o recurso do governo” (seria uma metáfora para o regime penitenciário?).

            A safra estava grandiosa do cinema nacional quando no lançamento de ‘Bicho de Sete Cabeças’, com grandes obras-primas como ‘Lavoura Arcaica’ e ‘Abril Despedaçado’ e, claro, o grande ‘Cidade de Deus’, que viria no ano seguinte. Sem saudosismos, mas é uma época que faz falta. E nem faz tanto tempo assim.

Nota: 10,0

Imagens:








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